TRAUMAS PESSOAIS: Feridas Invisíveis que Moldam Nossa Jornada
- Marcela Emilia Silva do Valle Pereira Ma Emilia
- 6 days ago
- 6 min read

🧠 As Feridas Invisíveis que Moldam Nossa Jornada
Trauma pessoal não é só "drama da vida" ou uma desculpa para a autocompaixão excessiva. E definitivamente não é fraqueza – é biologia que se esconde entre sinapses moldando nossos pensamentos, sentimentos e reações ao mundo.
Eles são respostas do cérebro a experiências que nos sobrecarregam, moldando pensamentos, emoções e comportamentos de formas que nem sempre vemos, pois nem todas as cicatrizes são visíveis.
Dados e pesquisas reais contam mais sobre como o cérebro e o sistema nervoso respondem ao que nos “quebra”. E a neurociência ajuda a compreender as camadas que estão envolvidas nessa ferida, revelando que o trauma definitivamente não é um sinal de fraqueza, mas um sistema nervoso tentando sobreviver.
🔬 O Que São Traumas Pessoais?

Na estrada da vida, diferente das curvas esperadas e das pedras que, de vez em quando, nos derrubam, existem aquelas que não são tão visíveis como um acidente, ou uma perda repentina. Há algumas curvas que são mais sutis ou pedras que estão enterradas no solo, mas que, sem querer, alteram o curso de uma viagem inteira.
Trauma pessoal é mais ou menos isso: uma ferida invisível que não sangra na superfície, ecoando por anos, deixada por eventos (ou séries de eventos) que ativam o "modo sobrevivência" do cérebro, nos fazendo sentir impotentes, moldando nossas escolhas, relacionamentos e até a forma como nos vemos no espelho.
No fundo, trauma não é só “coisa ruim que aconteceu”. Segundo a American Psychological Association (APA) trauma é uma resposta emocional intensa a um evento ou série de eventos que nos sobrecarregam, deixando-nos impotentes ou fora de controle. Ou seja, experiências únicas que marcam a vida do indivíduo diferente daquelas que afetam grupos inteiros (guerra, desastre). Ultrapassa a capacidade de regulação do cérebro e do corpo, não dependendo da gravidade do evento em si, mas da forma como o sistema nervoso o processa, sendo o trauma o registro de um perigo que nunca terminou.
Diferente de um estresse passageiro, ele persiste, alterando circuitos neurais – o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) é ativado, liberando cortisol e adrenalina. A amígdala (alarme de medo) detecta ameaças e entra em alerta máximo; o hipocampo (memória) se inibe pelo estresse; e o córtex pré-frontal (PFC) (centro de raciocínio e controle) perde momentaneamente sua função de comendo.

Esse desequilíbrio faz com que o corpo permaneça em estado de defesa mesmo que após o fim da ameaça. E é por isso que as pessoas traumatizadas podem reagir a sons, cheiros ou expressões neutras como se o perigo ainda estivesse presente. E porque a pessoa traumatizada oscila entre hiperexcitação (ansiedade, irritação, impulsividade) e entorpecimento emocional (apatia, distanciamento) – o sistema nervoso alternando entre a fuga, luta e congelamento em busca de segurança.
Existindo dois tipos principais de traumas:
⚡ Traumas Agudos: eventos isolados e intensos, com um assalto ou a morte de ente querido. Eles batem como um raio deixando um choque imediato.
🕰️ Traumas Crônicos: exposições prolongadas, como abusos emocionais ao longo dos anos ou negligência familiar. São ladrões silenciosos, que roubam a confiança aos poucos.
📌 FIQUE LIGADO 📌
O que diferencia um estresse comum de um trauma?
A PERSISTÊNCIA!
Se o evento continua a invadir a mente através de flashbacks, ansiedade ou padrões repetitivos de comportamento, é um sinal de que essa ferida pode ter se tornado invisível.
🧩 Raízes no Cérebro e na Vida

Traumas pessoais não nascem do nada; eles são sementes plantadas em solos férteis da história da vida, surgindo de eventos únicos, como acidentes, perdas, agressões, ou experiências crônicas, como negligência, rejeição, bullying ou ambientes familiares imprevisíveis.
Desde a infância, o cérebro aprende a lidar com as ameaças – reais ou simbólicas – construindo repostas. Porém, com o tempo, as respostas podem se tornar marcas profundas, sendo que nem todas vieram de algo que aconteceu, mas do que faltou acontecer – o acolhimento, o cuidado, o olhar que teria sinalizado segurança para o cérebro.
Quer dizer, as feridas invisíveis não são apenas acontecimentos, mas memórias dolorosas que causam reações neurobiológicas que influenciam comportamento, percepção, vínculos e até a forma como se interpreta o presente. E a neurociência mostra que o cérebro, especialmente durante a infância e adolescência, é como uma esponja: absorve as experiências, codificando-as em padrões neurais que duram décadas.
Origens, infelizmente, comuns:
Infância e Vínculos: muitos traumas começam cedo, com relacionamentos instáveis com cuidadores – pais ausentes ou imprevisíveis – podendo criar um apego ansioso, onde a criança aprende que o mundo é perigoso. Ativa cortisol crônico, reprogramando o eixo HPA (estresse).
Relacionamentos Tóxicos: aqui pode se relacionar as “feridas do coração”. Traições, uma separação traumática, ou gaslighting inflamam a amígdala, podendo ativar o “modo de sobrevivência” do cérebro, liberando cortisol em excesso e reprogramando a amígdala resultando em desconfiança neural, isolamento emocional, ou, ironicamente, codependência extrema.
Eventos Disruptivos: acidentes, doenças ou perdas repentinas ativam o "congelamento" simpático (a mente estar presa no trauma), deixando o cérebro em hipervigilância – comum em sobreviventes de traumas agudos.
Contexto Social e Culturais: mesmo quando pessoais, os traumas são influenciados pelo contexto. Pressões culturais (ex: discriminação), pressão por performance no trabalho ou até mesmo a cultura da “positividade”, que invalida emoções, acumulam-se como gotas de água no hipocampo até transbordar o copo, alterando memória e emoção.
Estudos de neuroimagem revelam que traumas alteram o hipocampo, fazendo que o passado se sinta sempre no presente. Porém, os mesmos estudos mostram que traumas crônicos, mesmo encolhendo o hipocampo em até 10%, tem na plasticidade neural a recuperação com práticas baseadas em evidências.
💡 Caminhos de Compreensão e Regulação

Essas feridas sussurram, reescrevendo a narrativa. O cérebro em "guarda", que prioriza sobrevivência sobre florescimento (como os dados de estudos longitudinais confirmam), é como um vaso de cerâmica rachado. Não é estar necessariamente um “grande drama hollywoodiano” – claro que não é uma viagem leve – mas é essencial entender essas cicatrizes para poder navegar para a solução com mais clareza.
Na mente: Ansiedade crônica, depressão ou TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) podem criar padrões de autossabotagem, procrastinação, medo da falha;
No corpo: Doenças autoimunes, insônia, doenças crônicas sem causa física podem ser traumas somatizados de um “corpo gritando e uma mente calada”;
Nas relações e jornadas: Ter as máscaras do dia a dia – ser o amigo engraçado, mas evitar a vulnerabilidade, estar no emprego seguro, mas estar sufocado.
O cérebro não é estático, e a neuroplasticidade pode ser o caminho para que novas conexões sejam formadas, reorganizando circuitos e restaurando o equilíbrio perdido. E a solução do trauma pessoal não é apagar o passado, mas reeducar o sistema nervoso para o presente.
Aliás, a neurociência do apego mostra que vínculos seguros criados durante a vida, principalmente durante a infância, fortalecem o córtex pré-frontal ventromedial e as redes de empatia, tornando o sistema nervoso mais flexível diante do estresse,
Intervenções baseadas e neurociência ajudam a restaurar o diálogo entre o corpo e a mente:
Psicoterapia Somática: trabalhar a percepção corporal para liberar energia acumulada no sistema nervoso.
Mindfulness e Respiração Consciente: reduzir a atividade da amígdala para fortalecer o córtex pré-frontal.
Terapia EMDR: Dessensibilização e Reprocessamento por Movimentos Oculares – estimula o processamento de memórias traumáticas.
Conexão Social: criar e fortalecer vínculos seguros liberam oxitocina, diminuindo cortisol e restaurando a sensação de segurança.
Expressão Criativa: a prática ou admiração da arte, escrita e música ativa o hemisfério direito, favorecendo a integração emocional.
Sim, os traumas pessoais moldam nossa estrada, mas neurociência nos dá o mapa. Não é cura mágica (para isso, consulte profissionais), mas compreensão profunda para navegar melhor. Traumas não resolvidos roubam presença, mantendo o indivíduo no piloto automático, longe da autenticidade.
Então, compreender essas feridas é como acender uma lanterna na estrada escura.
✨ Conclusão

Traumas pessoais são as feridas invisíveis que moldam a vida, a história biológica do ser. Elas não definem quem é o indivíduo, mas explica o porquê das reações.
A neurociência revela que o trauma é uma resposta adaptativa – uma tentativa do cérebro de proteção ao insuportável.
Mas o mesmo cérebro que registra a dor é capaz de reescrever o enredo. Curar-se é reconfigurar as sinapses da sobrevivência para as da confiança.
Porque, no fim das contas, o que molda uma pessoa não é o que ela vive, mas como o cérebro aprendeu a sobreviver a isso.
✋ Se ressoou, pause: Qual "ferida invisível" teu cérebro carrega? Não é sobre cavar fundo agora, mas sobre nomear e procurar um profissional que possa te ajudar.
Obrigada por ler essa jornada comigo. 💛
E, se precisar de indicações e ajuda, pode compartilhar aqui embaixo ou entrar em contato comigo! Você não está sozinho 🫂
📚 Quer ir além? Leia O Corpo Guarda as Marcas (van der Kolk).
Fontes: APA.org, van der Kolk (2014), estudos de neuroimagem da Harvard. Baseado na minha expertise em neurociência comportamental.
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