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COMO A NEUROCIÊNCIA EVOLUIU NOS ÚLTIMOS 20 ANOS?

  • Writer: Marcela Emilia Silva do Valle Pereira Ma Emilia
    Marcela Emilia Silva do Valle Pereira Ma Emilia
  • Jul 8
  • 5 min read
Como a Neurociência Evoluiu nos Últimos 20 anos?
Como a Neurociência Evoluiu nos Últimos 20 anos?

🧠 Como a Neurociência evoluiu nos últimos 20 anos?

 

A neurociência é uma das áreas da ciência que mais cresceu e se transformou nas últimas duas décadas. Desde os anos 2000, os avanços em tecnologia, genética, inteligência artificial e análise de dados remodelaram radicalmente o que sabemos sobre o cérebro — e como usamos esse conhecimento para entender o comportamento humano, as emoções, as doenças mentais e a tomada de decisão.

 

Se antes a neurociência era restrita a laboratórios e publicações especializadas, hoje ela está presente na educação, na saúde pública, nas empresas e até no debate ético. Mas o que realmente mudou nesses 20 anos?

 

Neste post, você vai entender os principais marcos e transformações que moldaram a neurociência contemporânea.

 

 

🔬 1. Avanços tecnológicos: neuroimagem, estimulação e interfaces cérebro-máquina

 

As últimas duas décadas foram marcadas por uma revolução tecnológica na neurociência. O uso de técnicas de neuroimagem, como a ressonância magnética funcional (fMRI), eletroencefalograma (EEG) e magnetoencefalografia (MEG), se tornou mais sofisticado, acessível e preciso. Isso permitiu que pesquisadores visualizassem, de imediato, quais áreas do cérebro se ativam durante processos cognitivos, emocionais e comportamentais, em experimentos que ocorrem em tempo real.

 

Além disso, tecnologias como a estimulação magnética transcraniana (TMS) e a estimulação transcraniana por corrente contínua (tDCS) abriram caminho para intervenções não invasivas no cérebro, tanto para fins terapêuticos quanto experimentais.

 

Outro marco foi o desenvolvimento das interfaces cérebro-máquina, que permitem que sinais neurais sejam usados para controlar dispositivos externos — como nos trabalhos liderados por Miguel Nicolelis, em que pacientes com paralisia puderam controlar exoesqueletos usando apenas a atividade cerebral (Nicolelis & Lebedev, 2009).

 

 

Neuroplasticidade e Epigenética
Neuroplasticidade e Epigenética

🧠 2. Neuroplasticidade e epigenética: o cérebro é mais dinâmico do que se imaginava

 

Durante muito tempo, acreditava-se que o cérebro adulto era fixo e imutável. No entanto, os estudos das últimas décadas provaram o contrário: o cérebro é plasticamente dinâmico, capaz de se reorganizar em resposta a experiências, aprendizado e lesões.

 

Pesquisadores como Eric Kandel ajudaram a consolidar a base molecular da plasticidade cerebral, demonstrando como sinapses se fortalecem ou enfraquecem com o tempo (Kandel et al., 2013). Ou seja: neurônios que deixam de ser utilizados tendem a perder força nas conexões, mas podem ser reaproveitados em outras funções, formando novas redes e criando caminhos alternativos para o aprendizado. (Mas calma! Sei o quanto esse tema é fascinante — e vamos voltar a falar sobre neuroplasticidade em um post futuro 😉)

 

A epigenética, por sua vez, mostrou como fatores ambientais — como estresse, nutrição e experiências precoces — podem modificar a expressão genética sem alterar o DNA. São experiências suficientemente fortes vividas ao longo da vida que deixam uma marca — como se fosse um “carimbo” epigenético que prepara o corpo para responder melhor se algo semelhante acontecer no futuro.

 

E mais: em casos extremos, essa marca pode se tornar tão profunda que é passada adiante para as próximas gerações. Um exemplo disso são os estudos que sugerem que o trauma do Holocausto deixou marcas epigenéticas em descendentes de sobreviventes, influenciando a forma como seus genes são expressos e afetando sua saúde mental e resposta ao estresse.

 

Emoções e o Cérebro Social
Emoções e o Cérebro Social

💬 3. Emoções, comportamento e o cérebro social

Nas últimas décadas, a neurociência expandiu seu olhar para além das funções básicas e passou a investigar como emoções, relações sociais e tomada de decisões são processadas no cérebro.

 

Pesquisadores como Joseph LeDoux (medo e ansiedade), Lisa Feldman Barrett (teoria da construção das emoções), Paul Ekman (teoria das emoções básicas e microexpressões) e Antonio Damasio (consciência e sentimentos) contribuíram para redefinir as emoções como elementos centrais da cognição humana.

 

Emoções, comportamento e o cérebro social estão profundamente ligados à forma como gerenciamos nossos relacionamentos — ou seja, à inteligência emocional. Trata-se de um processo que envolve:

 

  • Autoconsciência (reconhecer emoções em si mesmo)

  • Autogestão (autorregulação, adaptabilidade, positividade)

  • Consciência social (empatia e percepção do outro)

  • Gestão de relacionamentos (influência, trabalho em equipe, inspiração)

 

 

A neurociência social também ganhou força ao estudar como o cérebro responde a interações interpessoais, empatia e normas sociais. Decisões complexas nos dias de hoje envolvem diferentes sistemas de valores e perspectivas morais — moldadas não apenas por cultura e ambiente, mas também por predisposições genéticas e epigenéticas (como vimos antes).

 

Essas descobertas têm impacto direto em áreas como educação, justiça e saúde mental.

 

Cérebro vs. Inteligência Artificial
Cérebro vs. Inteligência Artificial

🧠 4. Inteligência artificial e modelagem cerebral

 

Com o crescimento da capacidade computacional, a neurociência e a inteligência artificial passaram a caminhar lado a lado. Redes neurais artificiais, inspiradas no funcionamento do cérebro, vêm sendo utilizadas para simular processos cognitivos, prever comportamentos e até “recriar” decisões humanas.

 

Projetos como o Human Connectome Project (EUA) e o Human Brain Project (UE) investiram pesado no mapeamento das conexões cerebrais em altíssima resolução.

 

Foi nesse contexto que a neurocientista Suzana Herculano-Houzel desmistificou a ideia de que usamos apenas 10% do cérebro. Na verdade, usamos o cérebro inteiro — só que de formas diferentes. Foi ela quem descobriu, por exemplo, que temos cerca de 86 bilhões de neurônios, sendo 16 bilhões no córtex cerebral, região responsável por nossas capacidades mais complexas.

 

E mesmo com todo o avanço em interfaces cérebro-máquina, ainda há dúvidas sobre a real possibilidade da inteligência artificial se equiparar ao cérebro humano. Afinal, é justamente essa densidade de conexões neurais — especialmente no córtex — que nos diferencia como espécie: empatia, emoções, criatividade.

 

Mas não podemos esquecer: é o cérebro humano que está criando o “cérebro artificial”. Ou seja, os limites do que a IA pode fazer ainda são definidos por nós. E é aí que entra a neuroética — para discutir até onde devemos (ou não) ir. Mas isso é tema para outro post, certo? 😄

 

⚠️ 5. A popularização da neurociência: avanços e armadilhas

 

Nos últimos anos, a neurociência virou tendência. O que antes era restrito à academia agora aparece em livros de autoajuda, discursos motivacionais, embalagens de produtos e técnicas de coaching.

 

Esse fenômeno trouxe benefícios — como maior interesse pelo tema e democratização do conhecimento — mas também abriu espaço para distorções. Muitos termos científicos passaram a ser usados fora de contexto, criando o que chamamos de neurobaboseira (ou neurobollocks, em inglês).

 

Por isso, é fundamental saber diferenciar ciência real de pseudociência com aparência sofisticada. O caminho? Buscar fontes confiáveis, artigos revisados por pares e profissionais com formação científica sólida.


🧭 6. O que vem pela frente?

 

As próximas décadas devem trazer ainda mais desafios éticos e inovações tecnológicas. Áreas como neurodireitos, neuroética, medicina personalizada e neurotecnologias de consumo estão em ascensão.

 

Pesquisadores como Rafael Yuste vêm defendendo a criação de regulamentações globais para proteger a privacidade mental das pessoas diante do uso crescente de tecnologias neurais (Yuste et al., 2017).


✅ Conclusão

A neurociência evoluiu de forma impressionante nos últimos 20 anos. O cérebro, que antes era uma caixa-preta misteriosa, hoje é estudado em detalhes — do nível molecular às redes cognitivas mais complexas.

 

Compreender essa jornada não só revela o poder da ciência, como também nos convida a refletir sobre o que consumimos, divulgamos e acreditamos como verdade sobre o cérebro.






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🔖 Referências

 

  • Nicolelis, M. A., & Lebedev, M. A. (2009). Principles of neural ensemble physiology underlying the operation of brain–machine interfaces. Nature Reviews Neuroscience, 10(7), 530–540.

  • Kandel, E. R., Dudai, Y., & Mayford, M. R. (2013). The molecular and systems biology of memory. Cell, 157(1), 163–186.

  • LeDoux, J. (2012). Rethinking the emotional brain. Neuron, 73(4), 653–676.

  • Barrett, L. F. (2017). How Emotions Are Made: The Secret Life of the Brain. Houghton Mifflin Harcourt.

  • Yuste, R., et al. (2017). Four ethical priorities for neurotechnologies and AI. Nature, 551(7679), 159–163.

  • Herculano-Houzel, S. (2019). And the evolution created the brain…, aula na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

  • Goleman, D. (2019). Emotions, the motor of our behavior, aula na PUC-RS.

  • Manes, F. (2019). How rational is the brain? (Emotion vs. Rationality), aula na PUC-RS.

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