O QUE A CIÊNCIA DIZ SOBRE A INTUIÇÃO?
- Marcela Emilia Silva do Valle Pereira Ma Emilia
- Sep 2
- 5 min read

🧠 O que a ciência diz sobre a intuição?
Intuição é uma palavra que desperta curiosidade. Muitas vezes é chamada de “sexto sentido”, associada a pressentimentos ou àquela voz interior que parece nos guiar em certas situações. No entanto, longe de ser algo místico ou sobrenatural, a ciência mostra que a intuição é um processo real do cérebro humano — rápido, inconsciente e fortemente baseado na nossa experiência de vida.
🔬 O que é intuição do ponto de vista científico

Intuição não é mágica, é processamento rápido!
Do ponto de vista da neurociência e da psicologia, a intuição é um processo de julgamento rápido e automático, que acontece sem que tenhamos plena consciência. Ela resulta da interação entre experiências passadas, memórias implícitas, emoções e padrões aprendidos que são acessados pelo cérebro de forma quase instantânea. Ou seja, como já falado em outros posts, é o que Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel, descreveu isso em seu famoso livro Thinking, Fast and Slow : Sistema 1: rápido, intuitivo, automático, emocional.
O cérebro armazena as experiências e padrões de forma implícita. Logo, quando se “intui”, é porque está acessando a essa base de dados sem pensar na lógica do passo-a-passo. O cérebro já tem a decisão tomada antes de que ela se torne consciente.
A pesquisa de Benjamin Libet, na década de 1980, que contava com que voluntários mexessem o punho ou dedo quando quisessem, sem aviso, enquanto ele media a atividade cerebral com EEG (eletroencefalograma), descobriu justamente isso. Antes da pessoa relatar que tinha decidido mexer o dedo ou o punho, o cérebro já mostrava um potencial de decisão de 300-500 milissegundos antes.

Já o neurocientista António Damásio trouxe outra perspectiva complementar com sua teoria dos marcadores somáticos. Para ele, as emoções registradas em nossas experiências passadas deixam “marcas” que ajudam o cérebro a decidir com mais agilidade em situações semelhantes no futuro. Assim, a intuição é também emocional — ela é moldada pelos sentimentos que associamos às nossas memórias.
Do ponto de vista neurológico, estruturas como o córtex pré-frontal ventromedial, a amígdala e o hipocampo estão diretamente envolvidas nesse processo, além de circuitos ligados à memória implícita e ao aprendizado.
⚖️ Intuição e o Segundo Cérebro

Pode parecer estranho, misticismo, mas sim, a intuição e o estômago (e todo o trato intestinal, diga-se por passagem), estão super interligados e é a neurociência que pode explicar isso.
O estômago e todo o trato intestinal tem a maior rede de neurônios no corpo, excluindo o cérebro, com mais de 100 milhões de neurônios e sendo chamado de sistema nervoso entérico. E ele é tão complexo, que por alguns neurocientistas é chamado de segundo cérebro.
Para começar, é no intestino que se produz mais de 90% da serotonina do corpo (o neurotransmissor do bom-humor e bem-estar), quer dizer, como você está se sentindo irá refletir diretamente no seu conteúdo intestinal. E não só isso, essa região abdominal também influencia os neurotransmissores dopamina e GABA, intervindo em como percebemos os riscos e recompensas. Logo... em como intuímos.
Tanto os neurônios como os neurotransmissores estão ligados e se comunicando com o cérebro através do nervo vago (nervo que conecta o intestino ao cérebro), e quando se sente aquele “frio na barriga” ou o “aperto no estômago” é, literalmente, sinal do nervoso subindo de lá para o cérebro. Por isso, em situações de Ansiedade/Decisão importante, dizemos que o intestino fala (frio na barriga, nó no estômago, borboletas).
Essa comunicação é bidirecional, não é apenas do intestino/estômago para o cérebro, mas também ao inverso com as respostas aos estados emocionais.
Do ponto de vista neurocientífico, essas sensações corporais que servem como guias são chamadas de interocepção : capacidade de o cérebro perceber sinais internos do corpo (batimentos cardíacos, respiração, estômago, ...). Então, a neurociência está mostrando que a intuição não é apenas só mental, mas uma junção de pistas somáticas corporais. A ínsula, no cérebro, interpreta esses sinais corporais e os integra com emoções e memórias, nascendo assim a sensação de que “tenho um pressentimento”.
🧪 Evidências científicas sobre a intuição

Estudos mostram que especialistas utilizam a intuição de forma mais eficiente do que iniciantes, justamente porque têm um repertório maior de experiências armazenadas no cérebro. A intuição, nesses casos, nada mais é do que a expressão rápida desse conhecimento acumulado.
A intuição, então, é útil em contextos familiares e recorrentes, nos quais já acumulamos experiência, ou em outras palavras, o cérebro já tem os padrões acumulados. É o caso de um médico experiente que, apenas ao observar um paciente, consegue perceber sinais sutis de uma doença, mesmo antes de ter todos os exames em mãos.
Mas, não é por isso que se pode confiar cegamente na intuição dessas pessoas. Em situações novas, complexas ou de grande impacto pode ser arriscado. Investidores, por exemplo, que seguem apenas “um pressentimento” podem ser vítimas de vieses cognitivos, como o excesso de confiança ou a ancoragem.
Participante ativo da intuição, é o córtex pré-frontal ventromedial (vmPFC). Ele é a chave para integrar emoção mais experiência, e gerar a sensação do “certo ou errado”.
Um exemplo clássico da participação do vmPFC é o experimento de Antoine Bechara e Antônio Damásio et al. (1997), o Iowa Gambling Task (IGT). O teste consistia num jogo de azar, nas quais os baralhos eram conscientemente vantajosos, havia uma lógica de ganho. Porém, criava-se um fator de recompensa e punição de tal maneira que criava quase que um conflito real de atração imediata e recompensa ou punição probabilística atrasada. E o interessante aqui foi que o participante tinha que escolher adiantado se queria jogar para ganhar ou perder tudo, apostando se a carta iria virar boa ou rui. Mas o teste mostrou que as pessoas já suavam nas mãos (resposta corporal) e o cérebro mostrava atividade no vmPFC antes mesmo de eles decidirem racionalmente. Ou seja, o corpo e o cérebro já “sabiam” intuitivamente antes da mente consciente entender.
Pessoas que tem danos no vmPFC acabam por serem privados do sinal somático/emocional confiando apenas numa análise de custo vs. benefício que são muitas vezes conflitantes envolvendo consequências imediatas e futuras. Por isso o seu poder de avaliação dos sinais corporais está prejudicado a uma escolha desvantajosa.
🎯 Aplicações práticas

A ciência sugere alguns caminhos sobre quando confiar e quando desconfiar da intuição:
Quando confiar:
Em situações familiares, em que já acumulamos experiência.
Em decisões cotidianas e rápidas, nas quais gastar energia analítica seria desnecessário.
Quando desconfiar:
Em cenários novos ou altamente complexos.
Quando há muito em jogo e o risco de erro é alto.
O mais eficaz, segundo as pesquisas, é combinar intuição com raciocínio analítico. Essa integração garante decisões mais equilibradas, aproveitando a velocidade da intuição e a cautela da razão.
🌟 Conclusão

A intuição não é mágica. Ela é resultado do funcionamento sofisticado do nosso cérebro, que acessa memórias, emoções e padrões de forma inconsciente e veloz. Em muitos momentos, ela nos guia com eficiência surpreendente. Em outros, pode nos levar a erros previsíveis.
A intuição é uma economia de energia que as vezes se faz necessária, e faz a diferença na vida de especialistas. Inclusive, em algumas tradições orientais a intuição é vista como sabedoria superior. Mas a neurociência por outro lado, mostra como isso é fruto de aprendizado + emoção.
O que a ciência mostra é que intuição e razão não são inimigas, mas parceiras. Saber quando confiar na primeira e quando recorrer à segunda é a chave para decisões mais sábias e equilibradas.
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